A Hiace, o Hipermercado, a avó Tina e o resto


Quase todos os portugueses adoram ir ao Supermercado. É um facto que pode parecer estranho mas é real. Se se tratar de uma grande superficie então o êxtase é ainda maior. O Hiper é o Exlibris da diversão Tuga. O "ripipi" adora a mistura exótica entre parafusos de 10 mm, o último livro de Tiago Rebelo e as farinheiras de porco preto de Campomaior.
Uns porque adoram ver o movimento, reformados que estão de uma vida inteira de labuta como torneiro-mecânicos em Neuchatel, taxistas em Santo António dos Cavaleiros ou condutores de monta-cargas no aeroporto de Nancy (Oui c´est vrai ). Ansiosos por ver algo a mexer. Nem que "algo" seja assistir a meia dúzia de pessoas a escolher fruta da época, barritas de caramelo ou pensos higiénicos sem abas.
Alguns adoram provar todos os queijos, vinhos e enchidos nas respectivas feiras organizadas, até passam na padaria primeiro se preciso for para fazer uma sandocha nas tasquinhas.
Ouvem com a maior atenção as explicações que passam no LCD sobre as panelas de pressão Tefal, muitas vezes juam-se grupos em frente ao ecran

Muitos deliram com as conversas interessantes e desinibidas das meninas das promoções na zona dos iogurtes liquidos. Loucos por um pouco de atenção feminina, acabam por trazer para casa uma quantidade de iogurtes que daria para abastecer todas as alas do Hospital Júlio de Matos durante 6 meses. E um dos "hóspedes" da ala 3, o Rolando, gosta de tomar banho em Sveltesse de morango e frutos silvestres, enquanto atira setas a uma fotografia da Leonor Beleza em biquini.

Outros há que especialmente aos domingos, arrancam dos arredores com a família em peso.
E todos enfiados numa Toyota Hiace de 9 lugares dirigem-se à grande superficie para uma manhã de alegria e muitas novidades. Como quem parte para o Louvre depois de um pequeno almoço nos Champs Elysées ou para o National galery depois de uma manhã a feirar em Portobello Road. Ou aqui mais perto comer um pastel de Belém (quentinho e carregado de canela) antes de ir ver a sala-de-estar que o Berardo enfiou no CCB.
O Hipermercado está para grande parte dos portugueses como o Guggenheim está para os Bascos. Com a diferença que deve ser díficil comprar fiambre da pá fatiado e jardineira de novilho no museu de Bilbao. Pelo que o hipermercado para o português parte em vantagem evidente.
A indumentária deste espécime domingueiro é do mais "casual" possível. Um "Casual paroling" díria eu. Quase sempre tão descontraído como descabido:

Fato de treino impermeável com cores alternativas capazes de provocar descolamentos de retina (tanto macho como fêmea). Se estiver mais calor tira-se a parte de cima e as "cavas" amareladas (do súor) e tímidas escondem a penugem farfalhuda, "Tony Ramos style".
A acompanhar a fatiota sapatilha de futebol de 5 ou sandália de pele à "Jesus Cristo" para ele, e saltos alto agulha de alumínio para ela. Ambos de meia branca, ele com meias com raquetes de tennis cruzadas, ela de collants meia-perna rendados e de lycra. Unhas de gel pretas estragadas nas pontas elas e eles medalha com a imagem de nossa senhora dos navegantes e boné do SLB.
O macho apresenta normalmente cabelo encaracolado estilo "Becel" mas com mais gordura, a lembrar Marco Paulo nos anos 80. Ou a versão mais radical, uma patilha estilo Luke Perry da Cova da Íria.
Ela cabelo oxigenado com raízes pretas de 10 cm, uma autêntica auto-estrada das planícies douradas alentejanas desenhada na cútis.

Os adolescentes normalmente empastam o cabelo em gel acumulado ao longo da semana, várias camadas portanto, parecendo muitas vezes que lhes despejaram uma lata de leite condensado Royal em cima. Camisolas a dizer "de puta madre" da feira de São Mateus e sapatilhas "Puma contra-faction" directamente da mala da Renault Kangoo do César "coveiro" (também vende Rolex, Tous, Gant, lenços de Viana, atoalhados de mesa, geleia de Cerveira e uvas colhão de galo da zona do Fundão).

Já as meninas mais "envergonhadas" envergam mini saia estilo cinto mas um bocadinho mais curta para não estrangular as partes, roupa interior "desaparecida em combate" e top com brilho suficiente para substituir um sinalizador de aproximação aos barcos no porto de Leixões em dias de nevoeiro.

Unhas rosa choque "Rita Lee" com corações pretos e a cara mais pintada que um mimo cego com Parkinson. Por fim bota branca de napa até meio da coxa (estilo cabaret mas a puxar para o ordinário) e o cabelo a imitar a Cindy Lauper depois de ter estado toda a noite a vomitar enfiada na sanita com um problema gastrointestinal.

De nada valerá a pena dizer que o bom gosto não tem marca (mas a ter que seja a original por favor...)

Distinguem-se facilmente na debandada porque saem quase sempre pelo corredor que indica "saída sem compras". Um bocado como as idas da Lili Caneças ou da Cinha Jardim às compras, mas sem levar os artigos para casa está claro. Apesar de que nem uns nem as outras gastam 1 euro que seja.

O objectivo não é comprar mas sim passear e conhecer as novidades. Se houvesse febras e um parque de merendas, ficava-se para a tarde. Se o Mikael Carreira estivesse a dar autográfos junto aos enlatados melhor ainda. Mas sendo assim vamos andando, que a Serra da Boa Viagem ainda fica longe e a feijoada de chocos está na mala da carrinha a arrefecer. Para não falar na avó Tina que ficou no carro e a esta hora já deve estar mais queimada que o cartão de crédito de alguns directores regionais bancários logo no mês de Janeiro.

Conselho a todos: o perfume (ainda que despejado em todos os poros do corpo) dificilmente disfarça o cheiro da sovacada. Muito pelo contrário, adensa-o e intensifica-o.
Torna-se perigoso para as narinas dos desgraçados que passam, muitas vezes chegando a provocar acidentes com prejuízos incalculáveis.
A zona da roupa interior do Feira Nova dizem que é pior que a IP3 em fim de semana prolongado.
Antes apanhar uma suínada valente e ficar de cama uma semana.

E no meio de tudo isto, e para finalizar quanto ao tipo de clientela dos supermercados, há ainda uma pequena minoria de pessoas que vai ao supermercado com o objectivo, imagine-se, de comprar bens e utilidades de que realmente precisam.
Somos poucos, parece-me.
E cada vez mais uma espécie em vias de extinção. Bichos raros.
Preciosos por essa mesma razão. Para manter sff.































1 comentários:

Xani disse...

Fácil de comprovar...aconselho vivamente o épico Jumbo by saturday morning (sobretudo se após um feriado)...GOD! Nunca vi tanta orelha de porco embalada na vida!